Tire seu preconceito do caminho, que eu vou passar com o meu amor
A 20ª Parada LGBT de Palmas celebrou as pessoas que fundaram o movimento na cidade. Mais do que festa e luta, é momento de celebrar quem se é e trilhar novos caminhos
Por: Marco Túlio Câmara
17/06/2025 • 12h22 • Atualizado
O estacionamento do Espaço Cultural se coloriu. O trajeto que leva à praça do bosque se encheu de música e celebração. Mais do que uma festa, o que centenas de pessoas bradavam na noite deste domingo era do orgulho de ser quem se é. A Parada LGBT de Palmas se firma como um importante evento na cidade, não só para o público que luta, bate leque, canta, dança e desfila. Mas também para que todo mundo que passe por ali perceba que não se trata de uma simples aglomeração, mas o grito por liberdade.
Em sua vigésima edição, o evento celebrou quem iniciou o movimento na capital. São 20 anos de batalha por um espaço e visibilidade, apoio dos poderes públicos e da sociedade que insistem em nos matar e nos silenciar. Mais do que contar história de luta, é preciso registrar os avanços: casamento civil regularizado, acesso ao Ensino Superior e pessoas trans com doutorado – o título acadêmico mais alto na educação. O triste é ter que assinalar tudo isso como um avanço, e não somente como um dia normal. O pesado é pontuar como conquista como se fosse algo compensatório.

Foto: Reprodução | Redes sociais
Não há o que se compensar. Não deve existir uma condição. “Ela é uma doutra, mas é trans”. Mais do que gramática, sabemos o que essa conjunção adversativa quer dizer. “Eu te admiro muito, você é doutor, professor, escritor, apesar de tudo”. Apesar do quê? De ser eu mesmo? O que te incomoda? Se o incômodo é seu, lide com ele. Não transfira para mim ou para qualquer outra pessoa.
É cansativo. Lutar, gritar, apontar o dedo. Mas ainda é necessário. É cansativo não ter a leveza de andar de mãos dadas com quem a gente ama com receio do que pode vir a acontecer. É triste não poder contar para a família sobre os planos de vida ou do fim de semana por medo do que podem falar. É pesado fingir que aquela ‘colega de sala’ é só mais uma colega de sala que vai em casa fazer trabalho da escola.
E é por isso que a gente levanta, grita, brada, ocupa as ruas, bate leque. Com a consciência de que o caminho é muito mais longo do que os 2 km percorridos no último. Começou lá atrás, quando a primeira pessoa trans teve forças pra dizer para o mundo quem ela realmente é. Quando os primeiros amigos se juntaram para fazer um grupo e criar um movimento que mostrasse para a cidade toda a importância de se debater nossas questões. Quando aquela cantora de voz grave entoou que gosta de mulher e uma legião de outras meninas conseguiu berrar o que as sufocava.
Não é olhar para trás, mas acelerar pra frente com a segurança do que se avista no retrovisor. Para, assim, viajarmos por uma estrada tortuosa, mas de muita luz. Que vai se trilhando e se formando novos caminhos, com novos passageiros.
Marco Túlio Câmara é jornalista, escreve quinzenalmente neste espaço. Também é professor do curso de Jornalismo e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Sociedade da UFT. Doutor em Linguística Aplicada pela Unicamp, é autor de “Entrelinhas” e dos livros “Gestão de Conteúdo para Mídias Sociais” e “Planejamento Integrado de Comunicação”.